Análise da Conjuntura Político-Institucional Brasileira nº 001/2018


Consolidada no mês de junho de 2018.

1 - A greve dos caminhoneiros aprofundou a crise político-institucional, pois evidenciou a perda de direção política do bloco no poder pelo governo Temer. O governo não é mais capaz de encaminhar e aprovar o que falta das reformas neoliberais (reforma da Previdência, privatização da Eletrobrás, privatização da Petrobrás, etc.), nem de conduzir a própria sucessão.
A crise agravada pelo movimento dos caminhoneiros revelou o descontentamento de setores burgueses com a incapacidade do governo em resolver a greve, com aspectos da política de ajuste fiscal, como a política energética encaminhada pela Petrobrás, com o tabelamento do frete, etc. Diante disso, o agravamento da crise política e social é certo, com a possibilidade de acirramento do conflito político e a emergência de novas manifestações de massa com os quebra-quebras, e atos de rebeldia, além de greves e manifestações de massa.

2 - O vácuo político e de poder deixado pelo governo acirrou as divisões interburguesas no plano político, apesar da unidade em torno do programa econômico neoliberal extremado ainda se manter. Por conta disso, é crucial para as frações burguesas viabilizar a legitimação do programa neoliberal extremado pela via eleitoral, o que coloca a manutenção das eleições e da democracia restrita atualmente vigente como primeira opção de superação da crise pelo bloco no poder.

3 - Esta opção do bloco no poder convive com o grande obstáculo representado pela ausência (até o momento) de um candidato eleitoralmente viável e claramente identificado com o programa neoliberal extremado. O candidato orgânico do grande capital,Geraldo Alckmin, apresenta baixo índice de intenção de votos, apesar da grande capilaridade entre as diversas frações do capital e da estrutura partidária do PSDB. Marina Silva é uma alternativa, suficientemente comprometida com a plataforma neoliberal, porém, sem o apoio de uma grande estrutura partidária, o que demandaria a adesão dos grandes partidos à sua candidatura ou ao seu governo, o que exigiria uma costura política considerável para lhe dar sustentação.

4 - As outras candidaturas que apresentam chances eleitorais não contam com a adesão ou a simpatia majoritária do bloco no poder. Apesar do apoio de setores do agronegócio, de amplos segmentos dos pequenos e médios capitais e de setores das classes médias, Bolsonaro é um candidato demasiadamente contestado para estabilizar o processo político em caso de vitória. Além disso, a sua origem militar e a presença de elementos nacionalista-estatistas no seu discurso político provocam desconfiança no grande capital em relação a esta candidatura. Ciro Gomes tem trânsito suficiente em diversos setores do espectro político, da direita à esquerda, mas o caráter nacional-desenvolvimentista do seu programa obrigaria o bloco no poder a admitir concessões em sua agenda neoliberal ou forçá-lo a um estelionato eleitoral em caso de composição com o bloco o poder, o que poderia gerar a continuidade da crise. O mesmo se aplica à candidatura do PT, provavelmente Fernando Haddad, com o agravante de que a acomodação demandaria concessões ainda maiores por parte das frações hegemônicas do bloco no poder no que tange à aplicação do programa neoliberal extremado.

5 - Diante disso, apesar de mais arriscada, a possibilidade de suspensão do processo eleitoral ou de esvaziamento do poder decisório do voto popular se coloca por dois caminhos. O primeiro é a aprovação do parlamentarismo pelo Congresso Nacional, esvaziando o poder de governo do presidente eleito e transferindo-o para um pacto entre os partidos do campo golpista, com o apoio condicional de setores da esquerda (a exemplo do PT e do PDT). O segundo é uma intervenção militar que pode ocupar o vácuo político e de poder deixado pela “sarneyzação’ do governo Temer, mas que trás riscos muito maiores, pois a perspectiva “moderadora” (recentrar o sistema decisório, realizaras eleições, e/ou aprovar o parlamentarismo) pode degringolar para um regime cesarista militar por conta de três fatores: a) hoje os militares não têm capacidade operacional e contingente suficiente para impor a repressão generalizada sobre o conjunto da população; b) os movimentos sociais, partidos de esquerda e organizações do mundo do trabalho podem resistir e desencadear uma contra-ofensiva em escala progressiva; c) setores do grande capital não aceitam a pauta específica dos militares (submarino nuclear, continuidade do programa de aparelhamento bélico iniciado com a Estratégia de Defesa Nacional, continuidade da parceria militar com África do Sul e Índia em torno da defesa do Atlântico, não venda da Embraer ao capital estrangeiro, recuperação da soberania estatal sobre a Petrobrás, etc.) por conta do ajuste fiscal, bem como temem que um golpe militar fracassado venha a abrir uma situação de crise revolucionária. Assim, a progressão da crise político-institucional em direção de um regime cesarista carrega riscos ainda maiores do que a manutenção do calendário eleitoral e a tentativa de “legitimação do golpe de Estado à frio”.

6 - No plano da esquerda que se situa no campo do projeto democrático-popular ou que com ele mantém uma aliança política de longo prazo, a manutenção da candidatura Lula pelo PT, do ponto de vista das pretensões eleitorais do Partido dos Trabalhadores e seus aliados, é correta, do ponto de vista das pretensões eleitorais dos mesmos; todavia, compromete em grande medida a constituição de uma frente ampla político-institucional em torno de uma candidatura única, de perfil antineoliberal e antifascista, concorrendo para: a) pulverização do voto de esquerda do campo do projeto democrático-popular e seus aliados; b) comprometimento de uma frente ampla político-institucional que incluísse partidos e movimentos sociais que integram a esquerda anticapitalista; c) ampliação das possibilidades de cooptação dos candidatos melhor posicionados nas pesquisas (Ciro Gomes e Fernando Haddad) pelas frações do grande capital hegemônicas do bloco no poder. Isso não nos impede de apoiar o “Lula Livre”, pois se trata de combater a criminalização das lideranças e movimentos de esquerda e de defender seu direito democrático de disputar as eleições.

7 - A “sarneyzação” do governo Temer, as dificuldades burguesas de viabilização de uma saída minimamente estável e consensual e a piora nas condições de vida das classes trabalhadoras apontam para a continuidade da crise e para uma tendência de intensificação das lutas sociais e de manifestações espontaneístas e desorganizadas de descontentamento popular, o que exige de nós capacidade de diálogo com setores sociais dispersos e desorganizados e a construção da frente ampla no plano das lutas gerais e da frente de esquerda no plano das alianças estratégicas.


Escola de Formação Socialista (EFS)