Análise de Conjuntura Político-Eleitoral nº 004/2018

consolidado no mês de setembro de 2018


1- Na atual polarização político-eleitoral entre a extrema-direita e o centro do espectro político a disputa pelo centro tem sido vencida pelas forças de centro-esquerda, com as candidaturas Haddad (PT) e Ciro Gomes (PDT).

2- Assim que foi homologado como candidato do PT, Haddad começou a herdar os votos de Lula muito rapidamente, ultrapassando os outros candidatos do centro e aparecendo em segundo lugar uma semana depois. Tende a continuar crescendo na medida em que ocorram três processos: a) que o PT consiga disseminar para o eleitorado mais pobre a informação de que Haddad é o candidato de Lula; b) que o ato do dia 29/9 contra Bolsonaro, puxado pelo movimento de mulheres, seja nacional, massivo e permita uma espécie de “renascimento” do PT como maior partido do sistema político e única alternativa eleitoral viável de toda da esquerda, atraindo o voto útil; c) que a candidatura petista comprometa-se como o programa do golpe o suficiente para atrair o apoio das forças de centro-direita, seus votos e apareça confiável ao mercado. Este último movimento já está se dando, com o candidato petista negando que houve um golpe em 2016, afirmando que uma reforma da previdência é necessária, que o ajuste fiscal será feito ao longo dos quatro anos de mandato, além das indicações de que deverá entregar o Ministério da Fazenda para um economista neoliberal (fala-se em Marcos Lisboa, do Insper).

3- Ciro Gomes mantém o núcleo duro de sua proposta desenvolvimentista, apesar das concessões que também tem feito ao mercado, como patrocinar uma reforma da previdência baseada na capitalização individual, e continua forte no Nordeste; mas sua capacidade de disputar uma vaga no segundo turno depende cada vez mais da disputa entre as candidaturas de direita, desde o centro-direita até a extrema-direita. 

4- Depois do atentado à Bolsonaro a fragilidade das candidaturas Alckmin e Marina Silva se ampliou, gerando uma redução ainda maior em seus índices de intenção de voto. Marina desidratou com muita velocidade, evidenciando os limites de sua estrutura político-partidária e o limbo programático em que se colocou, pois ao mesmo tempo em que apresenta uma plataforma neoliberal e antipopular, se apega à condição de candidata honesta, sem investigações na LavaJato, o que nunca esteve realmente no centro da disputa política.

5- Alckmin também sofre uma desidratação considerável e está prestes a sofrer um processo de “cristianização” (abandono de sua candidatura por seus aliados em favor de outra), pois não apenas setores do capital, mas mesmo setores de sua coligação já vislumbram apoiar Bolsonaro para evitar uma vitória do PT. Por outro lado, lideranças organicamente identificadas com seu projeto político já admitem a possibilidade de uma derrota, catastrófica para a sobrevivência do partido, fazem um mea culpa por conta do apoio tucano ao governo Temer, como tem dito Tasso Jereissati, e cogitam apoiar o PT no segundo turno, como FHC. Daí a recente ofensiva da campanha Alckmin contra Bolsonaro, procurando colocar-se como o único candidato do campo da direita capaz de derrotar Haddad. A grande mídia também se insere nesse esforço, como demonstram as denúncias de enriquecimento ilícito contra o deputado noticiadas pela Veja e amplamente divulgadas pela Globo, evidenciando que o PSDB ainda é o principal partido do bloco no poder. Este argumento pode atrair o voto útil do antipetismo para Alckmin, mas as últimas pesquisas indicam que essa tática não tem surtido resultado, pois o candidato continua estacionado em quarto lugar. 

6- Depois do atentado sofrido em Juiz de Fora, Jair Bolsonaro “surfou na onda” da comoção gerada pelo episódio e cresceu nos índices de intenção de voto, atraindo votos do centro-direita, o que lhe dá grandes chances de estar no segundo turno. Porém, parece ter atingido o teto! Seus índices de rejeição cresceram, diversos setores populares e de esquerda se mobilizam contra sua candidatura com grande ressonância até mesmo no campo da direita (haverá um grande ato nacional contra sua candidatura no dia 29/9), e o grande capital começa a duvidar de sua capacidade de resolver a crise e salvar o programa do golpe, a começar pelo capital internacional, que tem demonstrado altos níveis de desconfiança em relação a um hipotético governo Bolsonaro. Além disso, há o forte temor de que no segundo turno Bolsonaro seja o candidato ideal para a esquerda moderada (PT ou PDT) vencer as eleições, o que obrigaria a bloco no poder a tomar iniciativas que aprofundariam o golpe ou negociar com um governo Haddad ou Ciro Gomes.

7- Diante disso, há um esforço para vitaminar a candidatura Alckmin, apresentando-a como única real alternativa à instabilidade institucional representada pela vitória de Haddad ou Bolsonaro (tidos como dois candidatos populistas, de esquerda e de direta, respectivamente), desencadeando um ataque sistemático à agressividade e à inconsistência neoliberal do programa do candidato militar e propondo que as outras candidaturas do centro-direita renunciem em favor do candidato tucano. Na esteira deste processo organizações neoliberal extremadas, como o MBL, tem procurado se afastar de Bolsonaro. No entanto, como dissemos anteriormente, este esforço já dura quase duas semanas, mas até agora não apresentou os resultados esperados. Além disso, o fato de que as eleições presidenciais sejam “casadas” com eleições para governos estaduais, Congresso Nacional e Assembléias Legislativas dificulta a renúncia das outras candidaturas presidenciais por conta das alianças e coligações estaduais, mantendo a fragmentação do voto de direita no primeiro turno. Isto indica que a polarização entre a extrema-direita e o centro-esquerda deve se manter até o segundo turno.

8- Por outro lado, a perspectiva de alguns setores de “cacifar” a candidatura Ciro Gomes como alternativa de centro-esquerda para evitar a polarização entre Bolsonaro e Haddad tem tido pouco êxito. As ameaças de setores das Forças Armadas, inclusive da ativa (como demonstram as declarações do comandante do Exército), de intervir caso a polarização antipetismo proto-fascista x petismo se mantenha, alegando a ilegitimidade do futuro vencedor por conta da divisão que continuará a grassar na sociedade brasileira, só tende a reforçar esta mesma polarização. Em primeiro lugar, porque Bolsonaro não vai abrir de sua candidatura em favor de um novo golpe. Em segundo lugar, porque essas ameaças fortalecem a candidatura Haddad, esvaziando ainda mais as candidaturas de centro. Portanto, a não ser que haja uma reviravolta no processo político, como uma nova onda de denúncias contra o PT ou mesmo a suspensão do segundo turno, Haddad pode terminar o primeiro turno em primeiro lugar e Bolsonaro em segundo. Temendo isso, já se iniciaram as articulações pelo governo Temer para aprovar a reforma da previdência com o atual Congresso, ou seja, logo após as eleições e antes da posse do novo governo. O fracasso da candidatura Alckmin mantém no horizonte a possibilidade de um novo golpe (parlamentarismo ou intervenção militar). 

9- Os partidos do centro-direita tendem a se enfraquecer diante da extrema-direita, devendo adotar elementos do seu programa para sobreviver, como na questão da segurança pública, enquanto o campo proto-fascista, hoje galvanizado pela candidatura Bolsonaro, pode ganhar maior organicidade e se transformar num movimento fascista propriamente dito, particularmente em caso de vitória do PT. Caso os principais partidos de centro-direita, particularmente o PSDB, consigam sobreviver como representantes orgânicos do bloco no poder, o proto-fascismo deve orbitar em torno deles como força auxiliar e paralela ao Estado, mobilizável no ataque e na repressão aos movimentos sociais e partidos de esquerda.

10- Neste cenário de avanço político-eleitoral do PT, mesmo sem a candidatura Lula, a candidatura Boulos deve sair da campanha menor do que entrou, em termos de apoio político e de relação entre intenção de votos e votação efetiva. Neste sentido, a tática da direção do PSOL de lançar o líder sem teto para atrair parte do voto lulista e ampliar a inserção institucional do partido demonstra não ter tido êxito. Esta situação pode acentuar disputas internas no PSOL e concorrer para a criação de um novo partido a partir do MTST e de militantes e correntes políticas oriundas do próprio PSOL. Tal processo, caso ocorra, concorrerá para prorrogar a falta de unidade da esquerda socialista e dificultar ainda mais a definição de uma plataforma classista e a afirmação da autonomia diante da chantagem do “mal menor” de um hipotético governo Haddad. Por outro lado, o PT deverá ganhar musculatura em relação aos movimentos sociais e diante da esquerda socialista como principal anteparo à ameaça fascista, reconfigurando a chantagem do “mal menor” (ruim com o PT, pior com o Bolsonaro ou com o golpe militar!) e legitimando sua tática de conciliação com o grande capital e de acomodação com o programa contrarreformista do golpe. Por conta disto, a esquerda socialista deve recusar a chantagem do “mal menor”, mesmo compondo a frente ampla antifascista e apresentar uma perspectiva ao mesmo tempo antifascista, antineoliberal e socialista, sob o risco de diminuir ainda mais em tamanho e capilaridade social.